O Necronomicon, o polêmico livro profano

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Necronomicon, o Livro dos Mortos, o Livro dos Nomes Mortos, o Livro Maldito. Seja você um jogador de RPG ou não, muito provavelmente já deve ter ouvido falar desse livro que faz parte da cultura nerd/geek e até mesmo da cultura pop.

Porém, a pergunta que não quer calar: Esse livro é real? Ele existe ou existiu de verdade?

A resposta direta, infelizmente (ou felizmente) é não, o livro não existe e nunca existiu.

Agora com as expectativas mais baixas, vamos conhecer um pouco melhor a história por trás da origem do livro.

Um livro famoso

O criador do Necronomicon é ninguém mais, ninguém menos que Howard Phillips Lovecraft, ou como é mais conhecido, H.P. Lovecraft. Sim, o pai do senhor Cthulhu, Nyarlathotep, os Grandes Antigos e muitos outros.

Pode-se dizer que o Necronomicon é quase um personagem recorrente em muitas histórias do autor. Obras como Nas Montanhas da Loucura e A Sombra Perdida no Tempo, mencionam o livro várias e várias vezes. É muito comum, nos contos de Lovecraft, que seus personagens percam a sanidade simplesmente por verem o livro. Os mais corajosos que decidem ler seu conteúdo acabam enlouquecendo completamente.

O Necronomicon, o polêmico livro profano, RPG - Mestre Charles Corrêa

H. P. Lovecraft, o criador do Necronomicon. | Fonte: Mister Sams Hearon

Para ajudar a dar força ao mito da existência do livro, o próprio Lovecraft mencionou em uma de suas obras que o livro havia sido banido pelo Papa Gregório IX em 1232, logo após a sua tradução para o latim. Além disso, alguns exemplares ainda existiriam, um no Museu Britânico em Londres e outro na Biblioteca Nacional em Paris.

Esse tipo de artifício, que mistura realidade com ficção, é muito usado por vários autores e autoras de literatura. Isso ajuda o leitor a se situar na obra e traçar os paralelos entre o mundo do personagem e mundo real, mas ainda assim trata-se de uma obra de ficção.

O próprio Lovecraft escreveu, em várias ocasiões, que o livro não passava de algo imaginado por ele, para dar corpo às suas histórias. Em 1934, ele respondeu uma de suas leitoras da seguinte forma:

Sobre o Necronomicon – devo confessar que esse abominável volume é meramente fruto da minha imaginação! Inventar livros tão horríveis é uma espécie de passatempo entre os autores da ficção fantástica… muitos dos escritores que contribuíram com a Weird Tales inventaram seus próprios títulos. É divertido perceber como outros escritores usam personagens e livros imaginários em suas próprias histórias. É por isso que Clark Ashton Smith fala sobre o Necronomicon, enquanto eu me refiro ao Livro de Eibon, uma criação dele. Esta troca de ideias ajuda a construir um histórico pseudo-convincente, uma mitologia negra, lendária e realista – embora, é claro, nenhum de nós deseja enganar os leitores afirmando ser remotamente verídica“.

Em várias ocasiões, o editor da Weird Tales, Farnsworth Wright, sugeriu que Lovecraft escreveu o tal livro de uma vez por todas. Assim os leitores teriam a sua curiosidade saciada e não ficariam pedindo cópias ou informações sobre onde comprar o tal livro.

A verdadeira História

O blog Mundo Tentacular trouxe um pouco de luz ao surgimento dessa verdadeira lenda urbana. Reproduzimos aqui uma parte do conteúdo.

Originalmente publicado em Verdades e (principalmente) Mentiras sobre o terrível Necronomicon

No início dos anos 70, no auge da moda ocultista, dois monges ortodoxos teriam procurado o editor Harry Slater para oferecer a ele um manuscrito que seria a única cópia existente de um terrível livro de magia até então desconhecido. O nome do livro era Necronomicon.

Os monges afirmavam ter conseguido o manuscrito após um roubo perpetrado à biblioteca de um Bispo Ortodoxo chamado Simon. Um roubo a uma valiosa coleção de livros de fato ocorreu em 1972, mas embora muitos livros de valor tenham sido levados, o Necronomicon não era um deles. Slater afirmou ter comprado o manuscrito dos monges, mas jamais permitiu que o documento fosse examinado dizendo que seria algo extremamente perigoso. Essa preocupação, no entanto, não impediu que ele mandasse o texto para impressão e o publicasse como sendo um verdadeiro tratado de magia.

Herman Slater foi uma figura proeminente entre os adeptos do neo-paganismo e wiccan nos anos 70. Ele era dono de uma livraria popular em Nova York, a Warlock Shop, que vendia todo tipo de bugiganga, quinquilharia e publicava literatura barata sobre o mundo oculto.

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Uma das muitas versões impressas do Necronomicon. | Fonte: Pinterest

Em 1975, a editora lançou a primeira edição de “Necronomicon: o Texto de Simon” (ou “The Simon Necronomicon” como ele ficou mais conhecido). O material era supostamente parte de um manuscrito muito antigo escrito em inglês arcaico.

Segundo boatos, o livro teve uma tiragem de 666 cópias, vendidas a 70 dólares o exemplar. Os livros se esgotaram e no ano seguinte uma segunda edição com 3.333 volumes foi para o mercado. Eventualmente, os direitos foram comprados pela Avon Press, que imprimiu o livro em formato pocket book e o comercializou em massa ao custo de 5 dólares. Desde seu lançamento, o Simon Necronomicon jamais esteve fora de impressão e continua sendo vendido até hoje (vá lá conferir no Amazon, é verdade!)

Slater sempre alegou que a misteriosa história do Necronomicon atraía o público. Ele alertava a todos que o conteúdo do livro não era para qualquer um, a não ser os iniciados nos mistérios arcanos. É claro, isso fazia parte do marketing para promover seu produto.

Para começar, o verdadeiro autor de Necronomicon não é outra pessoa senão o próprio Slater. O livro é um tributo medíocre a Aleister Crowley com ideias chupadas de suas teorias e trechos inteiros copiados de livros sérios sobre mitos mesopotâmicos, acadianos e babilônicos. Trocando em miúdos: uma tremenda picaretagem.

Infelizmente a coisa fez sucesso. Esse sucesso se deve em grande parte a campanha do próprio Slater, que verdade seja dita, sabia como se auto-promover. Na época do lançamento do Simon Necronomicon, ele foi a programas de rádio e apareceu na televisão. Alegou que estava sofrendo pressão por parte de grupos conservadores e religiosos que tentavam impedir o lançamento do livro. Nada poderia estar mais distante da verdade… ninguém tinha sequer ouvido falar de Slater ou do livro. Mas a campanha ruidosa conseguiu gerar atenção e despertar interesse da mídia e do público.

Mas sobre o que é o Simon Necronomicon? A introdução diz que ele foi escrito por uma figura identificada apenas como “o árabe louco”. O livro é um tipo de testemunho, relatando as viagens desse personagem e suas experiências com os chamados Deuses Ancestrais que “aguardam mortos, mas sonhando“(!). Ele identifica entidades como Kutulu (!!) e Humwawa que seriam poderosos demônios sumérios (!!!). O livro ensina magias, rituais e símbolos de proteção e invocação para esses deuses, convenientemente adaptando rituais enoquianos.

No prólogo da última edição, o nome de H.P. Lovecraft é mencionado (pobre coitado!). O autor afirma que Lovecraft não inventou o Necronomicon. Ele provavelmente recebia emanações psíquicas que partiam de forças obscuras, para que ele compartilhasse a existência do livro com seus leitores. O texto defende que Lovecraft era uma espécie de médium capaz de captar trechos do Necronomicon verdadeiro, mesmo que jamais o tivesse lido.

É um pouco triste saber que H.P. Lovecraft morreu praticamente na pobreza e anonimato, tendo seu reconhecimento (e de suas obras) apenas posteriormente, enquanto outros tiraram proveito de sua criação.

O Al Azif

O Necronomicon também é conhecido como Al Azif. Dizem que esse é o seu nome original. Segundo o próprio Lovecraft, azif é o nome usado pelos árabes para designar aquele barulho noturno, produzido pelos insetos, que supõem ser o uivo de demônios.

O livro teria sido escrito por Abdul Alhazred, também conhecido como o Árabe Louco, por volta de 730 a.c, originalmente na cidade de Damasco, hoje capital da Síria.

Pouco se sabe sobre Abdul Alhazred ou como ele ele escreveu o livro. Conta-se que ele era um poeta, astrônomo e estudioso vindo de Sanaa, no Iêmen. Ele teria passado anos visitando as ruínas da Babilônia, os poços de Mênfis e o grande deserto do sul da Arábia. Ainda segundo relatos, Abdul Alhazred teria morrido em 738 a.c, devorado por um monstro invisível em plena luz do dia.

As descrições a respeito da forma física do livro também são imprecisas. Alguns afirmam que a versão original tinha suas folhas feitas com pele humana e que seus textos foram escritos com sangue, também humano. Sua capa, em couro, trazia um rosto agonizante, como saído de um pesadelo.

Outras versões, provavelmente traduzidas, seguiam o modelo dos tradicionais livros medievais, com suas enormes capas de madeira e seu interior de papiro amarelado, sujo e encardido pelo tempo. Os copistas responsáveis pela tradução do original (em árabe ou grego) para outros idiomas, obviamente, acabam enlouquecendo no processo.

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Uma das muitas descrições a cerca da versão original do Necronomicon. | Fonte: MilleCuirs – Deviantart

Apesar da versão original ter se perdido no tempo ou ter sido destruída, ao longo dos séculos, várias traduções foram feitas (algumas totais, outras parciais) para os mais diversos idiomas.

Segundo alguns colecionadores de obras raras e conhecedores do ocultismo, existem 4 cópias em latim atualmente, além de uma versão mais completa em alemão. As cópias em latim se encontram na Bibliothèque Nationale em Paris, na Biblioteca da Universidade Miskatonic em Arkham, na Widener Library em Harvard, e na biblioteca da Universidade de Buenos Aires. Obviamente que, quando questionadas sobre a existência do Necronomicon em suas coleções, todas negam solenemente que tal livro nunca existiu.

Conteúdo profano

Poucos sobreviveram para contar o que há nas páginas do Necronomicon. Vale ressaltar que o vislumbre de uma única página do livro, pode levar a pessoa à loucura total.

Os relatos através do tempo variam, mas de forma geral podemos dizer que o livro contém muitos rituais de invocação de seres antigos e incompreendidos pela mente humana. Também há muitos feitiços, para os mais variados propósitos e que podem ser usados a favor ou contra o invocador.

Em suas páginas também estão descritas algumas entidades dos Mythos e forma como você pode entrar em contato com elas, por sua conta e risco, que fique bem claro.

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Dizem que o conteúdo original era muito perturbador para a mente humana. | Fonte: Goomi32 – Deviantart

Funcionando como uma verdadeira enciclopédia dos Mhytos, o Necronomicon pode ser uma importante arma no combate aos Grandes Antigos (e outras criaturas), uma vez que possui informações importantes e até mesmo rituais de banimento e aprisionamento dessas entidades.

Infelizmente, boa parte dos investigadores que tentaram usar o livro para fins benéficos e justificáveis, se é que isso existe, acabaram mortos ou enlouquecidos no processo. Por isso, pense duas vezes antes de conseguir colocar as mãos num exemplar, pois este pode ser o último livro que você irá ler.

Necronomicon em jogo

Na 7º edição do Chamado de Cthulhu, somos apresentados a pelo menos 5 versões diferentes do livro. Você pode usar as estatísticas como elas aparecem ou fazer pequenas modificações de acordo com a sua aventura e/ou campanha, ou ainda, conforme a necessidade do seu grupo. Só tome cuidado para não acabar enlouquecendo todos os seus investigadores.

Al Azif

Versão em árabe traduzida/transcrita por Abdul al-Hazerd, 730 DC.

A forma original do livro é completamente desconhecida, mas é sabido que inúmeras cópias circularam na idade média e atualmente ela é considerada por muitos, como uma versão perdida.

Perda de Sanidade: 2d10
Mythos de Cthulhu: +6/+12 por cento
Nível de Mythos: 54
Tempo de estudo: 68 semanas

Manuscrito de Sussex

Versão em inglês traduzida pelo Barão Frederic, 1597.

Trata-se de uma versão confusa e incompleta da versão em latim do Necronomicon. Teria sido impressa na Inglaterra, na cidade de Sussex.

Perda de Sanidade: 1d6
Mythos de Cthulhu: +2/+5 por cento
Nível de Mythos: 21
Tempo de estudo: 36 semanas

Necronomicon

Versão em grego traduzida/transcrita por Theodoras Philetas, 950 DC.

Uma versão mais simplificada, sem os mapas e gráficos da versão original. Teria sido confiscada pela igreja e tempos depois, desaparecido misteriosamente. Estima-se que a última cópia foi queimada em Salém por volta de 1692.

Perda de Sanidade: 2d10
Mythos de Cthulhu: +5/+12 por cento
Nível de Mythos: 21
Tempo de estudo: 68 semanas

Versão em latim traduzida/transcrita por Olaus Wormius, 1228 DC.

Por muito tempo circulou como manuscrito até que foi impresso na Alemanha no final do século XV. Uma segunda edição teria sido reimpressa na Espanha no século XVII. Sabe-se que algumas cópias existem até os dias atuais.

Perda de Sanidade: 2d10
Mythos de Cthulhu: +5/+11 por cento
Nível de Mythos: 48
Tempo de estudo: 66 semanas

Versão em inglês traduzida por Jonh Dee, 1586 DC.

Trata-se de mais um manuscrito baseado na versão grega e que nunca chegou a ser impresso. Três cópias completas são conhecidas, mas seus paradeiros não.

Perda de Sanidade: 2d10
Mythos de Cthulhu: +5/+12 por cento
Nível de Mythos: 45
Tempo de estudo: 50 semanas

Essas são as versões mais conhecidas através da história, mas dado ao valor histórico do livro, não há garantias de que outras cópias tenham sido feitas e circulam por aí até os dias de hoje.

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Charles Corrêa
Charles Corrêa

Programador Web, Jogador de RPG e Jogos Eletrônicos, Mestre nas horas vagas. Costuma jogar com as classes Paladino, Monge e Feiticeiro de D&D, Dragonborn, Aasimar, Elfo e Meio-Elfo são as Raças favoritas.

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