Artifício RPG. lançou um novo conteúdo!
Imagine um jogo de D&D que começa com um templo perdido, dois companheiros misteriosos chamados Kavir e Ri Om, e um Tressym — aquele gato alado fofinho que mora nos cantos mais estranhos dos livros de monstros. Agora imagine que esse jogo nunca verá a luz do dia, igual a sua série predileta da Netflix ou seu outro serviço de stream favorito. Pois é, esse era o “Project Dante”, o RPG de ação e aventura em mundo aberto que a Hidden Path Entertainment desenvolvia com a licença oficial de Dungeons & Dragons. Enfim, Project Dante Cancelado. Silenciado. Arquivado em uma pasta com 44 demissões e um LinkedIn com desabafos.
A notícia vazou recentemente, não por comunicado oficial da Wizards of the Coast, como tanto abordamos em posts recentes, mas por meio do portfólio online de um dos sound designers do estúdio, encontrado e divulgado pelo MP1st. O jogo já tinha nome interno, conteúdo jogável, personagens com vozes temporárias e um bestiário clássico — incluindo Panteras Deslocadoras e até a própria Tiamat. Não era só conceito: era projeto. E ainda assim, foi abandonado como tantos outros da recente leva de cancelamentos promovida pela Hasbro/WotC em 2023, conforme relatado pela Bloomberg.
Sem Paraíso: Project Dante Cancelado
Entre as imagens vazadas, é possível notar que o design do jogo seguia a cartilha dos action RPGs modernos: visão em terceira pessoa, mobilidade fluida, combate com múltiplas habilidades e puzzles ambientais. A comparação imediata, claro, é com Dragon Age: Inquisition ou Jedi: Fallen Order — o que faz sentido, considerando que o sucessor espiritual de Project Dante hoje está nas mãos do estúdio Giant Skull (fundado por Stig Asmussen, o diretor de Jedi: Survivor). Mas há uma diferença: Dante parecia ter uma pegada de exploração cooperativa e construção de grupo, em que o jogador principal contava com companheiros que influenciavam tanto os diálogos quanto as lutas.
A escolha de nomes como Kavir e Ri Om não parece acidental — há um toque de exótico e multiversal, típico das campanhas de Forgotten Realms ou Eberron, como se o jogo quisesse flertar com algo mais abrangente que a velha fantasia medieval. A presença de puzzles, UI com múltiplas habilidades e a ambientação em um templo escondido mostravam um foco mais tático, quase como uma fusão entre Zelda e Mass Effect ambientada no universo D&D. Estávamos diante de um projeto ambicioso, mas com os pés ainda firmemente plantados no design mainstream — algo como o “Dragon’s Dogma da Wizards”, só que com orçamento e IP garantidos.
Quando o portfólio é a única lápide
O mais trágico do Project Dante Cancelado não é o cancelamento em si — esse já era conhecido desde janeiro de 2023. O lamento está no modo como ele ocorreu: em silêncio, sem direito a uma prévia oficial ou entrevista. A Hidden Path só veio a público um ano depois, por meio de um post resignado de Michael Austin no LinkedIn (que está sendo atualmente minha melhor fonte de informações). O motivo alegado: corte de verbas e reestruturação de projetos na WotC. A consequência imediata: 44 profissionais desligados e o desaparecimento de um título que, ao que tudo indica, estava bastante avançado.
E nesse ponto, a crítica ao modelo de produção da Wizards of the Coast é inevitável: como uma empresa que detém uma das IPs mais lucrativas e robustas do mundo geek permite que um projeto com essa base simplesmente se perca nos ventos do LinkedIn?
Não é a primeira vez que a WotC age com esse grau de indiferença editorial. A própria comunidade viu isso recentemente com a história truncada de diversos desligamentos e migração para outras editoras e com o apagamento contínuo de autores clássicos da franquia. A Wizards parece operar hoje como uma entidade corporativa imune a narrativas — o que é irônico, para uma empresa baseada em contar histórias.
Project Dante Cancelado: O cemitério dos jogos que nunca foram
A morte de Project Dante não é um evento isolado. Em 2023, a Wizards da Hasbro cancelou cinco projetos digitais relacionados à sua IP. Entre eles, estavam jogos promissores que tentavam expandir o universo de D&D para além do papel, dados e caneta. E a estratégia é clara: reduzir risco, maximizar lucro e evitar qualquer projeto que exija tempo, risco criativo ou algum grau de experimentação. O mesmo espírito que levou à demissão de Jeremy Crawford e à saída de Jess Lanzillo está em jogo aqui — uma transição de uma empresa de criadores para uma empresa de gestão de marca e ativos.
Para quem acompanha nossos posts, tem pelo menos um parágrafo que afirmo que a WotC não está mais interessada em fazer RPG. Ela quer fazer franquias. Se não for Baldur’s Gate 3 – e mesmo assim dá BO – que estoura em crítica e vendas, então não serve. Se não tiver retorno imediato em métricas de pré-venda ou engajamento online, não vale o investimento. Em outras palavras: a Wizards não está disposta a fazer outro Neverwinter Nights. Ela quer o Fortnite da Fantasia.
Por isso, Project Dante Cancelado é também a morte de uma possibilidade. A de vermos um jogo de D&D que não precise gritar no TikTok, que tenha tempo de respirar, testar e falhar. Que sirva ao imaginário da franquia, e não apenas às métricas trimestrais da Hasbro.
Mas nem tudo está perdido?
Curiosamente, apesar da guilhotina corporativa, há vida após a morte. Três novos jogos de D&D estão em produção — e todos com abordagens diferentes:
- O AAA da Giant Skull, com DNA de Star Wars Jedi: Survivor, promete ser o substituto espiritual de Dante. Ainda não tem nome público, mas já está em desenvolvimento e foi tema de matéria extensa que fiz, destacando seu uso da Unreal Engine 5 e o envolvimento de veteranos da indústria.
- Project Baxter, da Starbreeze (de Payday), vai pelo caminho dos jogos como serviço. É cooperativo, online, e já carrega a maldição de todo jogo multiplayer moderno: a dúvida se terá servidores ativos e conteúdo suficiente após seis meses.
- O D&D da Gameloft, ainda sem nome oficial, aposta em elementos de sobrevivência, como se Stardew Valley conhecesse Planescape. Pode parecer estranho, mas considerando o sucesso de Disney Dreamlight Valley, pode ser a aposta mais comercialmente segura do trio.
Nenhum deles, no entanto, parece se aproximar do que Dante prometia. Nenhum deles visa a experiência clássica de campanha, companheiros e ambientação profunda que só um CRPG ou action-RPG bem escrito pode proporcionar. Dante era o Dragon Age de D&D. Os que vêm aí são apenas os serviços digitais de 5e.
Por fim, literalmente, com o Project Dante Cancelado e não é apenas o cancelamento de um jogo. É o reflexo de uma mudança sistêmica na relação entre o hobby e seu dono corporativo que venho batendo bastante na tecla em posts recentes. É o mesmo movimento que enterra suplementos experimentais e projetos artísticos em nome de Battle Passes e campanhas padronizadas. Se hoje falamos em decolonizar o RPG com títulos como Coyote & Crow (teremos novidades incríveis em breve sobre esse joo), também precisamos pensar em desmercantilizar o D&D. Porque enquanto o RPG de mesa for visto como IP e não como forma de arte, teremos mais Dantes cancelados do que jogos lançados.
E a pergunta que fica é: quando a Wizards anunciar seu próximo jogo, você vai acreditar que ele verá o fim do desenvolvimento? Ou vai esperar que vaze no Imgur de um ex-funcionário demitido?
O post Project Dante Cancelado: Wizards Enterra Mais um Game foi escrito pelo Artifício RPG, especialista em conteúdo de RPG em Português!
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Artifício RPG. lançou um novo conteúdo!
Project Dante cancelado e imagens de conceito de arte vazadas só agora: o Dragon Age de D&D que nunca existiu. Arte, vozes, puzzles — tudo deletado pela Hasbro. Um templo escondido, um Tressym e combates táticos em Forgotten Realms.
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Charles Corrêa, também conhecido pelas alcunhas “Overmix” ou “Nandivh”, é um apaixonado por RPG e desenvolvimento web. Residente em Porto Alegre/RS, estuda programação desde 2001 e trabalha na área desde 2010.
No mundo do RPG, iniciou sua jornada como jogador em 2014 e, desde 2018, dedica-se a mestrar campanhas envolventes e desafiadoras, especialmente dentro dos gêneros de horror e dark fantasy.
Com experiência em sistemas como D&D 5e, Pathfinder, Cthulhu Dark, Vaesen e, mais recentemente, Savage Worlds, Charles também nutre uma curiosidade especial por Rastros de Cthulhu.
Conhecido entre seus jogadores como um mestre sádico, ele adora desafiar até mesmo os mais experientes combeiros, criando missões e encontros que exigem estratégia e criatividade. Inicialmente utilizando o Roll20 como plataforma, atualmente conduz suas campanhas no Foundry VTT, sempre buscando formas de melhorar a experiência de seus jogadores, aplicando seus conhecimentos em programação para aprimorar a jogabilidade e imersão.
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